terça-feira, 20 de abril de 2010

encontro

Ela andava perdida perdida. Pra lá e pra cá, visitando gente, imitando o Creysson, fumando o Bob, chamando o Hugo. Estava, digamos, tentando se encontrar, procurando entender seu lugar no mundo etc. Não queria se casar, não é isso. Tinha acabado de acabar uma dessas histórias parecidas. Mas estava à procura, sabe como é, viver um desses lances superficiais pra nunca mais voltar, pra não olhar pra trás e se arrepender do que faz, como diz uma natalina. Talvez tenha visto nele uma chance dessa. Talvez ele tenha visto nela algo semelhante. Um tric tric, um tatibitate, um spitnick, enfim... alguém sentiu alguma coisa suficiente para. E ela que não era de entrar, e ele que não sabia se sair, acabaram se encaixando por lá mesmo e deu no que deu. O vicio tem dessas coisas, depois é que começam as coceirinhas e se descobre uma intolerância à lactose, alergia a camarão, indigestão com coisas que levam gergelim. Vai entender! Só sei que os vejo juntos, ainda: o sorriso dele no ombro dela, as marcas dela no pescoço dele, e a sobreposição de tons das roupas que nunca estão combinando, que nunca parecem concordar que vão pro mesmo lugar. Mas já estão lá, sabe, se acharam.

quinta-feira, 15 de abril de 2010

tudo novo de novo

Não queria roubar-lhe flores, presentes, apetrechos de antigas relações, imortais. Chegou com uma taça de silêncio - queria experimentar o improviso simpático de quem não sabe por que veio - desajeitou as almofadas do divã, rolou pra baixo do tapete. Observa. Observa. Venera tanto que abala. Por fora tudo em concordância, conjunturado; costurando e descosturando línguas e lábios, alinhavados. Sede. Suspiro. Certeza? (parece desajeitada ela, tentando evitar a queda, do chão; tentando parar o trem nos trilhos, com a mão). Ignora que que cada encontro é uma saliva sua que sai da boca, é um cheiro seu no outro corpo, é um peito que vai beijado pela mão de outro; costas, nuca, pescoço; até ir-se toda, inteira, e não ter mais volta.

segunda-feira, 5 de abril de 2010

sobre avisos e promessas


Soube que se separaram. Não pude conter a petulância de vir até aqui, de sair sabe lá Deus de onde, e vir, sabe lá Ele com que forças, até aqui, pra dizer que eu te avisei. Eu te avisei, eu te avisei. Eu disse tantas vezes que poderia citá-las pra que adormecesses, meu anjo. Eu disse e pensei e acho até que incomodei você com esse assunto por meses, até que você se foi, e eu entendi mas não me conformei, nunca. Não sou homem de mascarar sentimentos, não sou homem de achar que é humilhação qualquer palavra dita num momento de emoção. Até mesmo os palavrões; venero todos, e os trago pra junto de mim, e os abraço - são filhos meus naquele instante. De te esperar, a vida foi ficando. Depois, antes que eu encontrasse uma forma de te reencontrar, perdi o ânimo que me levava a tomar conta de você, a espreitá-la sussurrante, a recusá-la de tanto amar. Fiquei sabendo que estavam bem. Fiquei sabendo que tiveram um filho. Esperei você me ligar nesse dia, como se houvesse possibilidade - havia? Esperei você me ligar no mês seguinte, e naquele ano todo eu andei por lugares em que corresse o risco. Até que um dia eu vi num fime... não, eu ouvi numa música... eu li no Coríntios... eu pensei comigo... que o amor é paciente, ô se é, o amor é um doente bêbado que vive cantando na sarjeta; ou um balão desses que transportam pessoas, que a gente olha pro céu e não acredita como é que voa. E eu te deixei de lado, e eu me deixei ser feliz. Mas agora recebo notícias tuas na Páscoa. Vocês se separaram. E você tem um filho pra criar; eu sei, esse cara não tem condições de lhe pagar uma pensão. Então eu tô te escrevendo aqui pra esse e-mail que me disseram que de vez em quando você acessa. Tô escrevendo pra pedir tua conta bancária e tua agência, teu retorno, teu carinho - tua carência? - teu perdão; tudo-tudo, e simplesmente que, por favor, minha filha, volte pra casa. Beijo do pai, da mãe e do cachorrinho Tobby.