segunda-feira, 19 de julho de 2010

salvação

Primeiro eu quis ficar pequena. Eu desejei de mim uma pequenez tão miúda que ficasse cada vez menor até desaparecer sua essência; vista de cima, a imagem fetal encolhida sobre lençóis brancos, espiralando. Depois comecei a pensar demais em mim, e a me compreender, me tolerar, entender que sou mesmo assim, mas que ainda tenho salvação. Comecei a fazer desenhos mentais do que eu pretendo, e de como vai ser bom daqui pra frente agora. Daí surgiu em mim - assim como se surgisse uma gotinha de infiltração numa rachadura na parede - surgiu em mim uma sensação de que tudo é tolerável, uma clareza que me fez, por instantes, amar a vida com tanta precisão, sabe! Eu vi isso indefinido desabrochar em mim, e crescer, crescer, crescer - sem forma sem nome - ficando enorme, até abraçar um monte de gente, e eu perceber - tudo muito rápido, preciso que entenda; não dura, não dura para sempre - eu percebi que a gente se ama; a gente, o Mundo; a gente tá aqui pra isso, pra ser isso, e cada um já se sabe que vai dizer essas coisas, e vai ter que ouvir essas coisas, e fazer ou não fazer coisas, mas se a gente compreende - como eu fiz e quase enxerguei alguma coisa perto de Deus - ganha uma liberdade escancarada para se sentir como quiser. A gente se salva.

6 comentários:

Marcia Barbieri disse...

Já estive aqui antes, adorei seus textos, são profundos e humanos, mas não sei se ainda encontrei essa compreensão infiltrando feito rachaduras do eu-lírico. obrigada de coração pelas coisas que escreveu no meu post, fiquei comovida, tenho tanto pra aprender, o elogio é sempre um estímulo para continuar tentando. Não faz muito tempo que descobri Silvia Plath, eu comprei o Ariel, tem poemas maravilhosos, ela é bem visceral, eu acredito nesse tipo de arte que dilacera pra existir.

beijos

Jardson Fragoso disse...

Gosto quando você tenta caracterizar as sensações e sentimentos, quando as metáforas tentam referenciar o que se é sentido por quem sente... gosto muito desse estilo e a prisão que o texto corrido nos deixa até o ponto final...

leila saads disse...

Tudo o que é tolerável podia ser exatamente aquilo que eu queria fazer, mas não é. Mas até que às vezes é bom olhar torto esse mundo nosso, né?

Um beijo!

Unknown disse...

Belo texto Priscila ! Gostei sobretudo da regressão inicial, muito bem construída...
abraço.

http://cartassideradas.blogspot.com/

Anônimo disse...

me apaixonei por você

Joana disse...

lindo demais!