segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

melhor assim

Talvez nunca eles saibam. Que se continuassem juntos não teria dado certo mesmo assim, que separados estarão melhor ou pior ou igual; não, igual nunca. Que agora ela sai pra dançar nos mesmos lugares que ele e aparentemente está tudo bem. Que ele já levou outra mulher no seu apartamento e disfarçaram bem. Que estão juntos há anos e ainda não se conhecem ou não se reconhecem agora que são ímpares. Por mais que ele saiba aquele jeito de morder a boca que é só dela; por mais que ela imagine o que ele está pensando quando sua nova namorada fala que adora Pitty; ainda que a família de um não se conforme e que a do outro dê graças a deus; ou que o cachorro dela confunda o alarme do carro e corra pra porta - o cão contém uma esperança; ou que no restaurante do bairro agora ele almoce sozinho ou nem vá ou passe pela salada sem se servir - agora não tem ninguém pra lhe encher o saco, e afinal de contas todo mundo vai morrer um dia; ainda que se encontrem, eventualmente se abracem sentindo, e se desmanchem depois, completamente perdoados; ainda que ocasionalmente esqueçam até por que brigavam e o que era tão horrível que não pudesse ser superado; ainda que haja as fotos e as músicas, os DVDs, os livros, as coisas na estante... coisas que não se dividem, que só vinham a somar; ainda que se preocupem do outro voltar dirigindo daquele jeito, do outro ir dormir na casa de um estranho, do outro não estar comendo direito, do outro estar se endividando de novo; ainda que se preocupem com o outro... com certa frequencia se esquecem - e cada vez mais se repete - na cama de outro adormecem, com outras canções se distraem; um beijo do outro não querem, conversar muito tempo piora, ver o outro sorrindo é quase como não querer que ele seja feliz; melhor se afastar, então, deixar o tempo cuidar - pra que ressuscitar uma coisa que nasceu no fim? Não sabiam. Não sabem. Talvez nunca eles saibam, mas melhor assim.

11 comentários:

A Língua Nervosa disse...

como saber então?
talvez cada um do seu lado possam repensar melhor a vida...a distância é um santo remédio algumas horas...vem a saudade e aí com ela toda aquela energia do começo!
:0)

Cynthia Lopes disse...

Oi Pri, estou cada vez curtindo mais estas tuas crônicas cotidianas, se as posso chamar assim. Só sei que elas tem tudo com a vida da gente e com elas a gente se identifica. bjs

Adriana Godoy disse...

Adorei, Priscila e esse lance dos cães é genial. Belo texto. beijo.

Sidnei Olivio disse...

Belo texto, como sempre. Voltei ao cotidiano, saudades daqui. Beijo.

Enzo de Marco disse...

Olá Pri ( posso Chama-la assim??)
adorei o texto acredito que tem muito a ver com aquele que postei , na verdade ele é uma musica de Ray Charles , chamada: "Born to Lose" eu achei linda e de um sentimento incrivel, coisa que aos poucos os seres humanos vem perdendo... Não é p/ cortar o pulso não viu kakakakka eu aconsenlho e ouvida com um bom vilho e fumando um belo charuto (As Vezes faço isso) no meu caso sempre cura ou melhor ameniza as dores da alma kakka
bjãos
Fé na vida no homem e no que virá pois ainda temos muito que andar por ai , muito que viver, muito que apreender e muito que encantar (encontrar)....

Non je ne regrette rien: Ediney Santana disse...

o que gosto nos teus contos é a sequência de imagens, vão nos levando a um monte de sensações boas de viver

Emília Pinto disse...

Os relacionamentos são complicados e chega uma hora em que não há outra saída a não ser um para cada lado ainda que alguma coisa reste, ainda que se recorde com saudades determinados momentos, ainda que essa pessoa nos desperte algum carinho, ainda que haja filhos, ainda que haja cão, ainda que haja tralhas de uma vida juntos ainda assim é melhor um deste lado e outro daquele. Ainda que já se tenham passado 34 anos, ainda que haja um montão de problemas, ainda alguma monotonis a dois e mais ainda cada vez menos diálogo, ainda assim vivemos no mesmo canto e ainda juntos. Ainda que não seja o ideal ainda é bom. Gostei muito do tema, Priscila. Um bom fim de semana e um belíssimo carnaval
Emília

ítalo puccini disse...

às vezes melhor não saber mesmo.

sempre bom ler teus escritos!

Sueli Maia (Mai) disse...

Teu texto me fez lembrar de uma música do Djavan: 'vida real'.

Talvez nunca soubessem o que saberão depois do após.
Beijos e bom domingo

Anônimo disse...

melhor assim =)

Priscila, maravilha, muito bom!

Unknown disse...

E quem é que sabe? Fazia tempo que não lia nada seu, mas obviamente vc não perdeu a mão. Como anda a vida de literatura?

bjo!